As polêmicas que chegam ao Senado - GUILHERME MAZUI | BRASÍLIA
O Senado recebe na manhã de hoje o anteprojeto de reforma do Código Penal. Criada em 1940, a legislação foi atualizada por uma comissão de juristas que propõe mudanças polêmicas, como a criminalização da homofobia e a flexibilização do aborto e da eutanásia.
A partir das 11h de hoje, quando o ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp entregar o anteprojeto de reforma do Código Penal ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), fica sob a responsabilidade dos parlamentares o destino das futuras normas que ditarão a conduta dos brasileiros.
Concluída em oito meses por uma comissão de 15 juristas escalados pelo Senado, a revisão atualiza uma legislação septuagenária, criada em 1940, e mexe em temas considerados tabus.
Ao passar de 361 para 543 artigos, o novo código criminaliza a homofobia, libera o aborto e a eutanásia em condições especiais, reforça o cerco à corrupção e legaliza o porte para o consumo de drogas leves como a maconha. Ainda tipifica novos delitos, como o terrorismo e as milícias. De antemão, a comissão tem consciência de que o anteprojeto provocará debates intensos no Congresso.
– É natural que surjam polêmicas. O Brasil tem diversidade religiosa, econômica, filosófica e cultural, que reflete na composição do parlamento. Elaboramos um trabalho técnico, sem fugir de nada – destaca Dipp, presidente da comissão de juristas.
O calhamaço nasceu das discussões do grupo composto por magistrados, advogados e professores de Direito. Na visão do ministro, o texto é moderno e compatível com a realidade nacional, embora tenha suscitado controvérsia até mesmo entre seus autores.
A votação que tratou da pena máxima e das progressões de regime, escalonadas em quatro níveis, passou apertada. As mudanças no sistema de prescrição nem sequer foram alteradas. E parte do grupo foi contrária à criminalização do enriquecimento ilícito, proposta louvada pelo senador Pedro Simon (PMDB-RS):
– Se ganho R$ 20 mil mensais e apareço com uma casa de R$ 10 milhões, terei de mostrar de onde tirei o dinheiro para a compra. É o começo de uma moralização no serviço público.
Aborto é alvo de evangélicos
A certeza de novas polêmicas, agora entre os parlamentares, faz o próprio Sarney atuar nos bastidores das negociações do tema. Ele tenta acelerar a tramitação e evitar que o texto se torne uma colcha de retalhos, já que a legislação passará por comissões e plenários do Senado e da Câmara. No entanto, eutanásia, aborto, homofobia e drogas sofrerão pressão das bancadas mais conservadoras. No início do ano, por exemplo, a bancada evangélica questionou a nomeação da ministra Eleonora Menicucci (Políticas para as Mulheres) porque ela tinha posições pró-aborto.
É provável que os artigos mais incandescentes sejam reescritos ou retirados do texto original. Presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Família, o senador Magno Malta (PR-ES) já incita os colegas a vetar tais propostas e a frear o avanço do código no Congresso.
– Ninguém tem o direito de tirar a vida de outra pessoa – justifica Malta, comentando as mudanças em torno do aborto e da eutanásia.
Para concluir os trabalhos, a comissão se reuniu três vezes por semana, em encontros que se estenderam por até nove horas. A maratona adequou a legislação à Constituição de 1988 e aos tratados internacionais assinados pelo Brasil, incorporou mais de uma centena de leis extraordinárias ao texto e revogou outras normas anacrônicas.
Apesar da perspectiva de mudanças, Dipp tenta manter o otimismo com o destino e a velocidade da aprovação do anteprojeto que será entregue hoje:
– A gente torce para que as mudanças sejam mínimas. Tenho expectativa de que no ano que vem teremos um novo Código Penal.
Os próximos passos do anteprojeto
1. O Senado transformará o texto do anteprojeto elaborado por uma comissão de 15 juristas em projeto de lei. A proposta tem 543 artigos, elaborados pela equipe durante oito meses de trabalho. O Código Penal atual, por sua vez, tem 361 e data de 1940.
2.A proposta de reforma do Código Penal passará pelas comissões do Senado até chegar ao plenário. A primeira comissão será a de Constituição e Justiça, onde um acordo de bastidores entre líderes deve garantir celeridade na tramitação do projeto.
3. Caso seja aprovado, o texto será remetido à Câmara, onde também deverá passar por comissões até ser votado em plenário. É na Câmara que o anteprojeto deve sofrer mais resistências e modificações, em função do elevado número de deputados e de opiniões.
4. Se o texto for modificado pela Câmara – o que é dado como certo –, o projeto retornará ao Senado para nova votação antes de ser submetido à Presidência da República. Se não houver alterações na Câmara, irá à sanção presidencial automaticamente.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O grande problema do novo e polêmico Código Penal é a postura benevolente dos juristas, as amarras tolerantes da constituição federal e a brandura das penas, com raras exceções como a criminalização da homofobia e o cerco à corrupção, ao terrorismo e às milícias. Ao liberar o consumo de drogas vai enfraquecer as iniciativas preventivas, de tratamento e de contenção ao tráfico. Nada a ver com a situação catastrófica vivida pela população nas ruas, pelas famílias dos dependentes e pela impunidade diante dos desperdícios e saques indevidos de dinheiro público.
O Novo Código Penal deveria interagir mais com o Código Civil na aplicação de contrapartidas, determinar penas temidas e cumpridas no mínimo a metade ao invés de 1/6, limitar as benevolências, estabelecer o trabalho penal obrigatório, e ser rigoroso a partir dos crimes de menor potencial ofensivo, pois a impunidade destes delitos é que fomentam a ousadia para cometer os crimes maiores e hediondos.
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