Cinco policiais militares de Campina Verde, no Triângulo Mineiro, foram condenados a quatro anos e dois meses de prisão em regime fechado, além da expulsão da corporação, por crime de tortura. A decisão recente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais é considerada exemplar pelo Ministério Público Estadual. Segundo o MP, o processo já estava caminhando para a absolvição e foi corrigido a tempo em segunda instância, atendendo recurso de apelação dos promotores. A ação se arrastou por 12 anos e as vítimas já não acreditavam em justiça, inclusive porque o crime ocorreu em um município de 18 mil habitantes que, segundo as vítimas, é caracterizado como terra sem lei. “Aqui é cidade pequena, onde quase não tem lei”, afirma uma das vítimas.
Pelo processo, em 12 de outubro de 2000, Marcelo Ferreira da Silva, na época com 25 anos, e o irmão dele, Eterno Ferreira da Silva, de 21, foram retirados de casa sem mandado de prisão e algemados, sem flagrante. O motivo seria porque ouviam som alto, bebiam e conversavam com amigos na porta de casa, quando a vizinha reclamou do barulho. Segundo a ação, quando um policial desligou o som e apreendeu o aparelho, Eterno teria ficado irritado, quebrado um copo e chamado os militares de “cachorros do governo, meganhas, policinhas de m.”.
Entenda detalhes da ação policial
Segundo a acusação, os irmãos, por terem desafiado a PM, foram detidos e espancados diante de crianças. Consta no inquérito que Eterno foi levado para a cadeia e Marcelo até a delegacia, sendo submetidos a mais de uma sessão de tortura, com chutes, socos, golpes de cacetetes e afogamentos em um tanque de lavar roupas. Eram dois homens contra cinco militares armados. Marcelo e Eterno acreditam que só não morreram em virtude do nome do último, batizado por escolha da mãe em honra à promessa feita ao Pai Eterno. “Sou Eterno, mas não sou para sempre. Tive sorte”, graceja a vítima.
Eterno sobreviveu porque era jovem e tinha saúde boa. “Sabe aqueles ossinhos do peito, igual tem no frango? Ficaram abertos durante muito tempo. Doía quando eu respirava. Graças a Deus, parou. Só meu rim ficou com problema”, revela o homem que, desde aquela época, trabalha no frigorífico local. Já o irmão Marcelo preferiu deixar a cidade e se empregou em uma usina no interior de São Paulo. “Nós tentamos entrar na Justiça e não deu em nada, porque somos pobres e não temos fama. É melhor deixar quieto e viver dos braços”, diz Marcelo, encerrando a conversa. Na época, nenhum dos dois tinha ficha criminal.
Abuso de autoridade
Segundo o Ministério Público, mesmo com todas as acusações de arbitrariedades, os réus já estavam sendo absolvidos do crime de tortura em primeira instância. Os réus Cláudio Francisco, Luiz Carlos Gonçalves, Ingler Tomaz da Silva, Zigomar Corrêa dos Santos e Marcelo Ricardo de Oliveira, todos policiais militares, seriam enquadrados apenas por abuso de autoridade. “Pela lei da época, a pena por abuso de autoridade era o pagamento de 10 dias de multa e o crime prescrevia em dois anos; agora, passou para três. Pedimos a reformulação da sentença para aplicação do crime de tortura, cuja prescrição é de 12 anos. Neste tipo de crime, a instrução é complicada e demora até sair a sentença. Os réus poderiam escapar ilesos”, diz Antonio Sérgio Tonet, procurador do Ministério Público de Minas Gerais.
Ele elaborou parecer com 22 laudas, esclarecendo que o delito de tortura consiste em sujeitar à autoridade alguém que se encontre sob seu poder, provocando intenso sofrimento físico ou mental, isto é, causando dor profunda na vítima. “O Tribunal de Justiça foi sensível à gravidade do caso e identificou provas suficientes para a condenação dos réus, eliminando a sensação de impunidade que então prevalecia”, afirma.
Com linguajar próprio, Eterno contesta a versão dos autos. “Quebrar copo eu quebrei mesmo, mas xingar, não. Isso foi invenção para livrar a cara deles. Se eles já quebraram a gente sem xingar, se eu tivesse xingado, teriam me matado. Bateram demais em nós”, desabafa a vítima, contando que “apertaram a algema até as mãos ficarem roxas”. E conclui: “Não xinguei porque não tinha nada contra a polícia, mas hoje tenho horror. Se pudesse, morava num lugar onde não existisse policial”.
"Não volto um milímetro na minha decisão", garante juiz
Reservado, o desembargador Pedro Vergara não costuma comentar processos em que atua, ainda que já tenha manifestado sua decisão nos autos. Neste caso, abre uma exceção. Vergara não esconde a indignação com a covardia dos policiais. “Não volto um milímetro na minha decisão”, declara o desembargador, relator do processo junto à 5ª Câmara Criminal pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Seu voto foi seguido por unanimidade pelos desembargadores
O processo já estava caminhando para a absolvição dos militares. O que levou o Tribunal de Justiça de Minas a condenar seis policiais por tortura?
O tribunal existe para corrigir enganos. Quando alguém é condenado por tortura, a perda da função pública faz parte da pena. O Supremo pode até reformar minha decisão, mas não volto um milímetro atrás. Estou absolutamente convencido de que cumpri meu dever.
O advogado das vítimas alega que não há provas suficientes para comprovar o crime de tortura…
Como advogado deles, pode ser que ele entenda que a prova é fraca. Para mim, a prova é justa. Há uma testemunha que mora em frente à delegacia e que depôs nos autos dizendo ter visto dois policiais usando a cabeça de Eterno, por duas vezes, para bater na porta de entrada da cadeia. Ela é uma testemunha que nada tem a ver com os fatos. Outra vizinha das vítimas assistiu aos dois sendo arrebatados de dentro de casa e afirmou ter ficado abismada com a atitude dos policiais de agredirem as vítimas na frente de crianças.
Na primeira instância, a juíza entendeu ter havido apenas o crime de abuso de autoridade…
Não vou me furtar a cumprir com meu dever depois de 38 anos de função. Meu juiz é o Pai Eterno. Ele é quem julga, se achar que estou errado Ele que me condene, mas na minha opinião houve violência desnecessária.
Esse processo pode ser considerado exemplar na condenação de policiais pela prática da tortura?
Não sei se seria exemplar, mas é justo. Não se pode revestir de poder público uma corporação para cometer violência e não ser punida, principalmente se ela tem por obrigação defender a população e não incutir medo e pavor.
O tribunal existe para corrigir enganos. Quando alguém é condenado por tortura, a perda da função pública faz parte da pena. O Supremo pode até reformar minha decisão, mas não volto um milímetro atrás. Estou absolutamente convencido de que cumpri meu dever.
O advogado das vítimas alega que não há provas suficientes para comprovar o crime de tortura…
Como advogado deles, pode ser que ele entenda que a prova é fraca. Para mim, a prova é justa. Há uma testemunha que mora em frente à delegacia e que depôs nos autos dizendo ter visto dois policiais usando a cabeça de Eterno, por duas vezes, para bater na porta de entrada da cadeia. Ela é uma testemunha que nada tem a ver com os fatos. Outra vizinha das vítimas assistiu aos dois sendo arrebatados de dentro de casa e afirmou ter ficado abismada com a atitude dos policiais de agredirem as vítimas na frente de crianças.
Na primeira instância, a juíza entendeu ter havido apenas o crime de abuso de autoridade…
Não vou me furtar a cumprir com meu dever depois de 38 anos de função. Meu juiz é o Pai Eterno. Ele é quem julga, se achar que estou errado Ele que me condene, mas na minha opinião houve violência desnecessária.
Esse processo pode ser considerado exemplar na condenação de policiais pela prática da tortura?
Não sei se seria exemplar, mas é justo. Não se pode revestir de poder público uma corporação para cometer violência e não ser punida, principalmente se ela tem por obrigação defender a população e não incutir medo e pavor.
Fonte:http://noticiadacaserna.blogspot.com/2012/03/pms-sao-condenados-por-tortura-no.html
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