Superlotação dos presídios mineiros, precárias condições de trabalho dos agentes penitenciários, número insuficiente de juízes e defensores públicos, necessidade de contratação de médicos para o sistema prisional, maior investimento na prevenção de criminalidade e na criação das Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac's), substituição do cárcere por penas alternativas. Esses foram os principais pontos debatidos na audiência pública realizada pelaComissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais na manhã desta quarta-feira (23/5/12).
O deputado Rogério Correia (PT), que solicitou a audiência, afirmou que o sistema prisional de Minas Gerais oferece 34.514 vagas, mas em março abrigava 51.794 detentos. Segundo ele, embora o investimento do Governo Estadual em segurança pública tenha aumentado nos últimos anos, não cresceu na mesma proporção da arrecadação de impostos. “Os dois principais programas estruturantes do governo, de prevenção ao homicídio e de integração policial, recebem cerca de 5% do orçamento da Secretaria de Segurança Pública. É muito pouco”, criticou.
Os deputados Duarte Bechir (PSD) e Rômulo Viegas (PSDB) cobraram mais investimentos da União. “Minas tem feito muito e sozinha. Queremos que o Governo Federal olhe mais por nós”, afirmou Bechir. Já o deputado Durval Ângelo, presidente da Comissão de Direitos Humanos da ALMG, ressaltou a importância dos debates e a necessidade urgente de melhorias no sistema prisional.
A promotora de Justiça Nivia Mônica da Silva, coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa Social dos Direitos Humanos, afirmou que o Brasil possui 269 encarcerados para cada 100 mil habitantes. “Temos o terceiro nível de encarceramento do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da Rússia.” Para ela, a superlotação penaliza detentos e agentes penitenciários, que ficam sobrecarregados. “Os pacientes psiquiátricos são os que mais sofrem. Existem 700 detentos nessas condições nas unidades prisionais de Minas, sem tratamento adequado”, criticou.
A promotora Janaína de Andrade Dauro apresentou um breve levantamento sobre a superlotação no Estado. Segundo ela, além dos Ceresp's de Belo Horizonte e Ipatinga, os presídios de Conselheiro Lafaiete, Januária, Pirapora, São Francisco e Varginha abrigam mais presos do que têm condições. Como exemplo, as promotoras citaram o Ceresp Gameleira, na capital, que possui capacidade para 400 presos e abriga 900, e os presídios Bicas 1 e 2, em São Joaquim de Bicas, que juntos possuem 1577 vagas e 3435 detentos.
Para a advogada da Pastoral Carcerária, Jaqueline Alves Pereira, a superlotação é uma violação dos direitos humanos. “Falta higiene. Há proliferação de doenças, especialmente as pulmonares e de pele. Não existe pessoal e infraestrutura para atender à crescente demanda. Faltam médicos e assessoria jurídica”, denunciou. Ela defendeu o combate à tortura, políticas sociais preventivas e medidas que substituam o encarceramento. A advogada lembrou o caso de um preso, detido há dois anos porque furtou uma barra de chocolate.
Investimentos – A presidente da Associação de Amigos e Familiares da Pessoa em Privação de Liberdade, Maria Tereza dos Santos, afirmou que 14.530 presos poderiam estar cumprindo penas alternativas. O membro da Comissão de Direitos Humanos das OAB-MG, Fernando Nogueira, também defendeu as penas substitutivas e afirmou que, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, 65% dos encarcerados são presos provisórios, que ainda não foram condenados. Maria Tereza criticou a falta de assistência à saúde nas unidades e a gestão dos recursos. “O governo tem investido de forma errada. É preciso investir em prevenção e nas Apac's”, defendeu. Ela lembrou que o trabalho de reintegração social feito pelas Apac's apresenta excelentes resultados.
O superintendente da Subsecretaria de Administração Prisional da Secretaria de Estado de Defesa Social, Pabloneli de Souza Vidal, afirmou que em 2003 havia 23 mil presos em Minas e uma única Apac. “Hoje são 52 mil presos, 28 Apac's em funcionamento e 9 em construção”, disse. “Nos últimos anos, o Estado criou 16 mil vagas. O investimento do governo mineiro foi real, mas insuficiente para acompanhar o crescimento da população prisional”, argumentou. Ele defendeu a realização de concursos para juízes e defensores públicos.
O defensor público Guilherme Tinti de Paiva afirmou que é preciso não apenas ampliar o número de profissionais, mas também melhorar a infraestrutura de trabalho e de apoio administrativo. “De novembro para cá, 120 defensores públicos realizaram 90 mil prestações jurídicas relacionadas ao sistema prisional.” Ele defendeu ainda melhorias nas varas de execução penal, investimentos em informatização, a criação de um sistema unificado que permita o levantamento de penas e a construção de unidades prisionais de regime semi-aberto.
Agentes penitenciários – A representante do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Conedh), Cleide Aparecida Nepomuceno, ressaltou que a superlotação viola não apenas os direitos dos presos, mas também dos trabalhadores do sistema prisional. “Vemos quase um trabalho escravo dos agentes penitenciários, em função do grande número de detentos”, completou a promotora Janaína de Andrade Dauro. Ela afirmou que nos Ceresp's da capital, os banheiros são “imprestáveis” e faltam refeitórios e vestiários. “O Estado precisa voltar os olhos para esses trabalhadores, que são muito cobrados”, defendeu. Fernando Nogueira, da OAB-MG, também defendeu a valorização dos agentes penitenciários.
Ao final da audiência pública, o agente penitenciário Júlio Rodrigues dos Santos afirmou que a categoria está sendo “humilhada e perseguida”. Segundo ele, há tratamento diferenciado para agentes efetivos e contratados, com privilégios para os últimos. Santos denunciou ainda que pessoal não treinado estaria recebendo armamento.
Outro agente penitenciário, Gustavo Henrique Estanislau Pereira, também participou dos debates. Ele afirmou que está sendo ameaçado de morte por ter descoberto supostos indícios de envolvimento de diretores de presídios e superintendentes da Subsecretaria de Administração Prisional (Suapi) com tráfico de drogas, tráfico de influência, assédio moral e sexual. “Estou em casa, afastado por motivo de saúde. Peço proteção”, afirmou. Ele entregou à comissão um pendrive com documentos que comprovariam suas afirmações.
Requerimentos – Foram aprovados vários requerimentos da comissão solicitando providências em relação aos assuntos discutidos na reunião. Será enviado pedido de providências ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, quanto a investimentos no Judiciário, visando: suprir a carência de juizes e servidores e o aumento em tecnologia da informação; implantar processo eletrônico na execução penal; implantar vara de execução penal de Belo Horizonte e Região Metropolitana; unificar levantamento de pena e disponibilizar "on line".
Também será enviado pedido à Secretaria de Estado de Defesa Social, solicitando: correção das falhas no sistema Setarim; construção de unidades para cumprimento de pena em regimes semiaberto e aberto.
Ao Governo do Estado, será encaminhada solicitação de investimento na Defensoria Pública, buscando o aumento do número de servidores e defensores públicos, ampliação das ferramentas de tecnologia da informação.
Será ainda realizada visita ao secretário de Estado de Defesa Social, para discutir o cumprimento da Recomendação Caocrim nº 08, de 28/2/2012, encaminhada pelo Ministério Público, requisitando a criação de 700 vagas em déficit no sistema prisional estadual. Também será enviado pedido de informações ao secretário sobre o cumprimento dessa medida.
Do deputado Rogério Correia, foram aprovados vários requerimentos, solicitando: envio das notas taquigráficas da reunião à Secretaria de Estado de Defesa Social, ao MP, à Defensoria e à OAB-MG; envio à OAB-MG e à Defensoria, dos trechos das falas de Júlio Rodrigues dos Santos e Gustavo Henrique Pereira, registradas nas notas taquigráficas.
Ao secretário de Defesa Social, serão encaminhadas várias solicitações, entre elas, um pedido de informações sobre gastos para manutenção de pessoas privadas de liberdade no sistema prisional do Estado, seja por unidade prisional, seja por interno.
Também será enviado ao secretário pedido de providências para apurar as denúncias do agente penitenciário Júlio Rodrigues dos Santos (que está à disposição da Suapi, sobre perseguição e assédio moral aos agentes) e do agente penitenciário Gustavo Henrique Pereira (lotado no Bicas II, sobre perseguição e ameaça que vem sofrendo de processos fraudulentos e falas ofensivas), conforme declarações de ambos contidas nas notas taquigráficas.
Rogério Correia também propõe visitas a unidades prisionais do Estado, para avaliar a situação da execução das penas privativas de liberdade e o respeito aos direitos humanos dos detentos.
Rogério Correia também propõe visitas a unidades prisionais do Estado, para avaliar a situação da execução das penas privativas de liberdade e o respeito aos direitos humanos dos detentos.
Por fim, Rômulo Viegas (PSDB) e Duarte Bechir (PSD) solicitam que sejam encaminhadas à Seds e ao Ministério da Justiça as notas taquigráficas da reunião com pedidos de providências. Eles requerem que esses órgãos avaliem a possibilidade e a pertinência de implantarem novas unidades prisionais com condições de comportarem trabalho agrícola, como forma de favorecimento à socioeducação dos internos e sua reintegração social.
De acordo com informações do gabinete do deputado, os agentes teriam declarado sofrer perseguições no dia a dia de trabalho e estariam atuando em condições precárias. Eles chegaram a apresentar denúncia ao Ministério Público, mas, até o momento, nenhuma medida foi tomada. Ainda segundo a assessoria do deputado Rogério Correia, a audiência será focada não apenas na atuação dos agentes penitenciários, mas também tratará da superlotação e da falta de tratamento digno aos presos.
De acordo com informações do gabinete do deputado, os agentes teriam declarado sofrer perseguições no dia a dia de trabalho e estariam atuando em condições precárias. Eles chegaram a apresentar denúncia ao Ministério Público, mas, até o momento, nenhuma medida foi tomada. Ainda segundo a assessoria do deputado Rogério Correia, a audiência será focada não apenas na atuação dos agentes penitenciários, mas também tratará da superlotação e da falta de tratamento digno aos presos.
Convidados – Foram convidados para participar do debate o subsecretário de Estado de Administração Prisional, Murilo Andrade de Oliveira; a defensora pública-geral do Estado de Minas Gerais, Andréa Abritta Garzon Tonet; a coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, Nivia Mônica da Silva; o presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos (Conedh), Emílcio José Lacerda; o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG, William dos Santos; o presidente da Comissão de Assuntos Penitenciários da OAB/MG, Adilson Geraldo Rocha; a coordenadora estadual da Pastoral Carcerária, Maria de Lourdes de Oliveira; o presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Estado de Minas Gerais (Sindasp/MG), Adeilton de Souza Rocha; e a presidente da Associação de Amigos e Familiares da Pessoa em Privação de Liberdade, Maria Tereza dos Santos.